sexta-feira, 15 de junho de 2012

Ainda por cá andamos...


Ora viva de novo! Tudo bem? Então e que tal essa semana? Agora a sério, se estão mesmo a responder a isto devem estar a fazer uma figura um tanto ou quanto ridícula, mas força! Peço só que filmem e que ponham no youtube.

Em primeiro lugar, evitam vir falar comigo, eu já sei que escrevo muito e que o pessoal cansa-se a ler. Mas não sei se já perceberam que isto são registos semanais, para eu depois me lembrar do que fiz durante a semana e como devem imaginar já acontecem demasiadas coisas num só dia quanto mais numa semana! Tá? Percebido? Se eu podia ser mais sintético e até ter mais algum trabalho, podia, mas há uma linha que divide aquilo que quero fazer e aquilo que não me apetece fazer… E esta é uma linha demasiado tendenciosa.

A ida à praia, como aliás tudo o que acontece neste país não poderia ter corrido sem um ou outro sobressalto. Decidimos alugar um carro e nesse aspecto há que dar valor à nossa Romina que conseguiu tratar de tudo! Não aconselho é andar de carro e tê-la como co-piloto, mas isso é outra história.

O ponto de partida ficou marcado para as 6h30. Claro que como pessoa correcta e responsável que sou decidi deitar-me às 5h30. Há quem diga que fui o último a chegar e que estiveram 30 minutos à minha espera, mas estou farto de tentar explicar e pode ser que agora se perceba melhor, que não tenho culpa de ter entrado uma manada de elefantes azuis ao colo de suricatas amestrados e que me tenham bloqueado a porta de saída do prédio! Ainda para mais, o meu telefone não gosta de tocar alto quando sabe que estou atrasado e a dormir e só por isso é que não consegui atender nenhuma chamada!

Pronto, agora que já me justifiquei, siga com a história. O ponto de encontro ficou marcado para as 6h30 e lá arrancamos nós em dois Toyota Corolas que por fora até pareciam ter bom aspecto. O destino seria Marracuene (a cerca de 30 kms de Maputo) onde de seguida apanharíamos um batelão e atravessaríamos para Macaneta (a praia). A viagem até lá correu bem, o Néné não levava cinto e teve de dar 100 paus a um polícia que segundo o próprio, precisava de almoçar, e nós fomos a ouvir o vasto reportório musical da Sónia.

Chegando a Marracuene informam-nos que o barquito estava avariado e que ainda demorava uma horita até a coisa voltar a funcionar. Decidimos ficar, até porque não tínhamos muito mais para fazer… A espera até se passou bem, estávamos rodeados de crianças com dotes espantosos como o de construir pequenos barcos ou carteiras através de uma folha oferecendo-os e dizendo “espero que ajude na tua viagem”, tínhamos também os típicos vendedores que acham sempre que sabem que o que nos faz falta quando vamos para a praia são adaptadores de tomadas.

Ao fim de uma hora de fotografias, palhaçadas, distribuição de bens alimentares, vulgo rebuçados, pelos mais pequenos e de uma tentativa de furto de um dos pequenos o barco fica bom! Isto em qualquer outro sítio do Mundo seria um alívio, mas devo relembrar que estou em Moçambique… Quando chega a nossa vez de subir para aquilo a que chamavam de barco mas que mais parecia uma jangada feita por um Tom Sawyer sob o efeito de estupefacientes, informam-nos que a entrada para o barco era demasiado elevada e que apenas os jipes podiam passar. Se podiam ter informado isso naquela hora que estivemos à espera? Podiam, mas não era a mesma coisa…

Decidimos então arrancar em direcção a Bilene que fica a cerca de 198 kms de Maputo. Isto eram 10h30, tínhamos Sol até às 16h e ainda eram mais de 2 horas de viagem. Uma atitude mais que sensata portanto!

Chegámos a Bilene por volta das 13h. Andamos às voltas à procura da praia e chegamos a um condomínio. Conhecemos logo o amigo Elias informa-nos que podíamos lá deixar os carros que ele ficava a tomar conta. Uma pessoa sente-se sempre segura quando sabe que tem um rapaz com cerca de 20 anos e 55 quilos de peso a tomar conta de dois carros…

Chegámos à praia e aí sim, finalmente percebi o porquê de tanta gente perder tanto tempo e fazer tantos quilómetros para ir a Bilene. Uma praia gigantesca, vazia, a areia mais branca que as paredes de um hospital psiquiátrico, e água parada, azul e límpida… Paradisíaco mesmo. Um barqueiro informa-nos que aquela era a parte apenas correspondente à lagoa e que se realmente quiséssemos conhecer a parte da praia teríamos que ir de barco. Tivemos relutantes para aceitar, mas o tempo já era curto e estava-se realmente bem ali. Sim, foi mesmo para meter nojo ;)

O resto do dia passou-se muito bem! Deu para jogar vólei, futebol e ocasionalmente uma mistura dos dois. Ainda conhecemos o Salazar com um jeito nato para esculpir figuras de madeira e que ainda nos personalizou um cinzeiro e um porta-chaves. Deu ainda para jogar dar uns toques com alguns locais que para lá andavam e descobrimos ainda o futuro pantera-negra da selecção (já estou a tratar do contrato).

Por volta das 16h e já todos rotos decidimos voltar para Maputo. Parámos em Manhiça para trincar qualquer coisa e voltar à estrada. Mas eis se não quando que um simpático senhor nos informa de que temos um pneu em baixo o que é óptimo para quem vinha a 130 km/h. Tiramos o pneu e pedimos lá a um rapaz se nos consegue remendar aquilo. Diz que sim e começa o serviço. O pneu tinha já sido remendado três vezes mas curiosamente o artista decidi apenas arranjar um deles. Claro que tivemos que ir até Maputo com um pneu a vazar por dois sítios, mas a pressa de levar o golo do Mario Gomez falava mais alto…

Um pequeno aparte, conduzir em Moçambique não é muito diferente de conduzir numa selva com antílopes a virem de frente, com a diferença que muito provavelmente os antílopes apercebem-se de que um embate de frente vai magoar um bocadinho… O conduzir à esquerda já não baralha muito, volta e meia ainda ligo o limpa pára-brisas em vez do pisca mas de resto tranquilo. O problema está mesmo com certos “animais” que não percebem que quando vem um carro de frente numa curva cerrada à noite, não é a melhor altura para ultrapassar… Estranho, eu sei, mas não é mesmo…
Claro que tudo isto é muito mais giro com as fotografias que o Charles e a Sónia disseram que arranjavam e que continuo à espera… Depois queixem-se quando virem um Land Rover preto na vossa direcção… Ainda assim podem ver algumas das fotos no meu facebook que o amigo Luís Pereira, "Matolas" para os amigos partilhou e eu roubei-lhas ;)

Chegamos a casa ainda a tempo de descobrir que a pontaria da selecção portuguesa está melhor que nunca, que o Postiga é provavelmente o jogador de futebol com a maior cunha da história, que o Miguel Veloso se não andasse sempre com o cardápio do Chimarrão na cabeça até era capaz de se tornar num jogador de futebol mediano e que o Paulo Bento tem mais medo dos alemães que o José Castelo Branco de casas de strip.

Depois do jogo e de ter perdido 50 paus a apostar naquela equipa, não consegui mais que adormecer com a mesma roupa com que fui para a praia.
O Domingo passou-se de forma tranquila. Acordámos cedo e fomos ao tanque de um hotel aqui perto (há quem lhe chame de piscina, mas eu continuo a achar que já vi senhoras a lavar a roupa em pias maiores) onde fiquei estupefacto com as qualidades técnicas de natação do Néné e da Bárbara! Não podem é tocar na água, mas de resto, nota 10! ;)

Ainda em relação à piscina, chegamos à conclusão de que a Rita Russo é a quebra-corações de Maputo… Dúvidas houvessem, deixo-vos com a mensagem do Celso, rapaz que teve o infortúnio de um dia servir uma imperial à Rita e de ser trespassado pela seta do cupido: 

“Oi bom dia Rita como estas de saúde?
Eu Celso estou bem.
Sabes Rita eu onte não apanhei sono em pessa em ti.
E eu difacto estou muito apajonado por ti Rita.
E tu não estas apajonada por mi.
Por favor Rita estou apdir namora comigo.”

Sinceramente Rita acho que estás a ser muito intransigente com o rapaz.. Ok, tudo bem que não interagiste mais que 10 minutos com o rapaz, mas alguém com uma qualidade literária suficiente para fazer lembrar um qualquer Camões cego dos dois olhos, merece no mínimo que tomes um descafeinado com ele.
Adiante, na parte da tarde fomos até à escola portuguesa comemorar o Dia de Camões e dos países da CPLP (sim, estou feito um emigrante autêntico). A festa correu bem, havia comes e bebes (optámos mais pelos bebes) e ainda deu para ver lá uma barraca dedicada à Académica. Deu também para saltar do telhado da escola numa suposta actividade radical para crianças mas que tinha todas as condições de segurança necessárias para encher a ala de traumatologia do pediátrico cá do sítio. Ah!! Mas calma, que estavam lá os bombeiros e o Charles para captar o momento mas apenas 35 minutos depois… O momento épico e que deve constar nos anais da nossa história (sempre adorei esta expressão) aqui por Maputo é mesmo o traje do André, que se conseguiu indumentar como um verdadeiro Moçambicano!


O resto da tarde até tinha sido animada, não tivesse eu uma reunião às 17h. O resto da tarde/noite rolou mais uma vez pelo Núcleo de Arte que como diria o meu amigo Mário, “estou lá titular todos os Domingos!”.
Na Segunda tivemos o jantar da comemoração do 10 de Junho que no entanto ficou para o dia 11 (cenas deles…), onde fomos convidados pelo Sr. Embaixador e respectiva esposa a estar presentes. Posso dizer sem pensar muito que se houvesse algum prémio a atribuir às pessoas que claramente não sabem vestir para um evento formal nós ganharíamos de longe… De resto foi bom, comes e bebes oferecidos, havendo uma clara aposta nos bebes…

 
Na terça tive doente e continuo a achar que foi tudo um complô organizado pela minha carteira para não me deixar ir ao karaoke ao Gil Vicente. O que interessa é que os Inov’s forem bem representados pela Sonie e pela Romina que pelo que sei deram um verdadeiro espectáculo em palco… Ainda por aí um vídeo, mas curiosamente este tipo de vídeos nunca vêm a público…

Quarta fomos ver o jogo da selecção ao Parque dos Continuadores. Havia um projector, pessoas, um comentador que era claramente adepto da selecção portuguesa mas que percebia tanto de futebol como eu de óleo para fritar atum campestre e curiosamente havia uma grande falange de apoio à selecção dinamarquesa composta unicamente por moçambicanos, que festejavam os golos com mais afinco que os próprios nórdicos que estavam ao meu lado (quero acreditar que no fundo apenas estavam confusos por Portugal jogar de branco). Já agora, eu sei que é estranho, mas conheci dinamarqueses em Maputo… O que também é estranho e me continua a fazer séria confusão foi aquele golo do Postiga. Até hoje ninguém me tira da cabeça que ele chutou a bola porque viu um alemão atrás dele e teve medo que ele lhe roubasse a bola de brincar…

Na Quinta houve mais uma futebolada com mais um massacre da minha equipa (uma vez mais, evitam, a história é minha). Também foi engraçado vêr o Rangel mandar a bola do Luciano para o Oceano Indico numa clara tentativa de aproximação do futebol aos tubarões… Deve ser da febre do Euro.

Ora esta semana já chega que já têm muito para ler e eu tenho que ir trabalhar. Amanhã vamos para a ilha da Inhaca passar o fim-de-semana e depois esperam-me 4 dias sozinho em Tete onde conto fazer luta-livre contra mambas e rinocerontes e onde espero participar no torneio regional de sueca selvagem.

Já agora gostaria também de partilhar os outros blogs desta malta que também se perdeu por aqui por Maputo comigo. Penso que existem mais, mas este são aqueles que me lembro para já.

Daniel Vaz -http://linhassoltasdodaniel.blogspot.com/
Mário Martins -http://molungo12.blogspot.com/
Sónia Carvalho - www.enikselom.blogspot.com

Estamos juntos!

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Mais uma semana...


Fico estupefacto com a quantidade de pessoas que me congratula por esta minha diarreia literária… Vá também tirando a minha mãe e a minha avó a única pessoa que lê isto é o guarda ali do prédio e é só porque lhe dou 10 meticais para o bolso. Mas mesmo assim, o facto de virem falar comigo significa que pelo menos tenho chateado o suficiente no facebook e isso deixa-me feliz, pois eu sou uma pessoa que chateia, que tem prazer na arte do chatear e que planeia a longo prazo ser o maior chateador de Santo António dos Olivais e quiçá arredores!

Depois da aventura pelo mato a semana passada até acabou bem, supostamente tinha o dia livre de Sexta, mas decidi vir trabalhar da parte da tarde. Sou assim…

A Sexta-feira acordou com uma ameaça de greve. As manifestações aqui estão longe dos cravos utilizados no 25 de Abril em Portugal. Em 2010, por exemplo, morreram mais de 20 pessoas numa manifestação e a cidade esteve isolada durante 4 dias. Com isto em mente, decido-me aventurar a pé pela cidade com o portátil a tira-colo. 

Não havia quaisquer sinais de grandes tumultos, exceptuando umas sirenes passageiras aqui e ali. Chego à empresa e informam-me que a greve tinha sido adiada para Segunda ou Terça devido ao dia da criança. Matar pessoas está bem, desde que não estrague a festa aos putos!
Estavam então lançados os dados para mais um fim-de-semana de folia com a inauguração da casa do David, Sónia, Romina e Rafael seguido de uma noite de danças de salão. Fui claramente ao engano… Continuo à espera de um convite para ir às restantes casas, pois isto de uma pessoa entrar sempre à força não fica nada bem. Enfim, estou a ver que também já há aquele grupinho que exclui o Jpzinho de visitar casas…

Ainda no fim-de-semana e para se compreender melhor como funcionam por aqui os polícias, num passeiozinho a pé até ao CFM (já falei sobre o CFM uma vez, não vou falar outra), conseguimos ser mandados parar três vezes, por três patrulhas diferentes na mesma rua e a pé! Devo referir que a rua não chega a ter 200 metros de comprimento e que há terceira vez a nossa paciência já não era das melhores…

O fim-de-semana acabou com uma ida ao Núcleo de Arte que como o João Vieira diria 439 vezes, “ESTE É O MELHOR SPOT QUE JÁ TIVE EM MAPUTO!!!!” Já ouvimos João…
O Núcleo de Arte é de facto um sítio muito bom para se passar o final do dia de Domingo. É um espaço cultural repleto de quadros e esculturas, algumas verdadeiramente impressionantes, onde podemos interagir com os artistas enquanto se bebe uma cervejinha e se come uma cachorro quente. Há também sempre uma banda ao vivo a animar o espaço, sendo que neste Domingo estivemos na presença dos Ras Haitrm & Guerreiros de Sião (está aí um link com uma música deles), uma banda Reggae com grande power que tiveram no Bushfire deste ano. O Bushfire é tipo o Sudoeste cá do sítio, mas como tive as mudanças lá de casa não tive oportunidade de ir. Como é óbvio, não vou falar sobre o festival porque ainda estou chateado por não ter ido… Se alguém quiser saber como é aquilo que pergunte ao Pedro Lagartixo, mas por favor que o faça enquanto eu não tiver presente! Juro que desta vez tirei fotos e até filmei! Mas foi com o telemóvel por isso o resultado iria ser algo do género daquele quadro “Urso preto numa floresta durante a noite cerrada sentado em cima de uma pantera”.

(Link com actuação dos Ras Haitrm - http://www.youtube.com/watch?v=jwPWBURKDgM)

Na Quarta fui ao Autódromo de Maputo (sim, Maputo tem um Autódromo!!!) que mais parece uma pista para motas de todo-o-terreno. Ainda lá, fui convidado para um almoço de Academistas o que me deixou logo muito feliz, apesar de não poder participar.

O resto da semana continuou com tranquilidade, dormir é definitivamente uma cena que não me assiste, experimentei comer Chima que parece um puré mas que é feito de farinha de milho e não sabe nada a puré (já vou por aí um vídeo da sua confecção para se perceber melhor), acompanhado por um bife que dava para alimentar um família de 15 norte-americanos obesos, fomos finalmente jogar futebol onde fui eleito o melhor jogador em campo com a mina equipa a ganhar por 15 a 0 aos coxos da equipa composta pelo Lagartixo, Charles, Rafael e Gonçalo (uma vez mais, é possível que não tenha sido bem assim, mas eu é que estou a contar a história, por isso eu é que sei… Ah e ainda de salientar que a equipa adversária tinha dois ex-jogadores profissionais e um brasileiro!).
Informaram-me ainda que de 2 a 12 de Julho vou andar no mato perdido pela Zambézia (província Moçambicana) acompanhado de pessoas que não conheço. Por um lado é bom pois dá para amealhar uns trocos, para conhecer melhor Moçambique a fundo e sempre tenho uma boa desculpa para não actualizar isto. Por outro lado o não saber se volto com os membros todos ou se não servirem de pitéu para uma tribo de canibais assusta-me um bocadinho.

(Preparação do Chima - http://www.youtube.com/watch?v=tUNWJg9k5w8)

Já a acabar a semana, fui visitar uma instalação da Self numa unidade hoteleira onde estava a selecção de futebol Moçambicana (estive a dois segundos de roubar uma camisola), e ao chegar à sede da empresa fui multado. Porque é que fui multado? Ia em excesso de velocidade? Matei 3 velhotas e um caniche? Ia a conduzir com mais álcool no sangue com o Zé Carlos Pereira em dia de missa? Não… Estava sentado com o carro parado em segunda fila à espera que um sujeito saísse com o carro para eu poder estacionar o meu. Óbvio que me armei em forte, usei todos os argumentos possíveis mas o senhor agente permaneceu irredutível não dizendo uma palavra. Estou em crer que não falava português, pelo menos escreveu “inginheiro” na minha profissão e enganou-se a escrever a matrícula do carro.

E pronto… Mais uma semana repleta de 329 aventuras… Amanhã devemos ir de carro até à praia e aposto que vamos ter de pagar uma taxa especial para molhar o pé direito sem levantar o esquerdo.

Estamos juntos…

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Visita a Mabomo.


Normalmente não costumo escrever posts com um espaço temporal tão curto entre eles. Neste caso não é por preguiça, mas porque não quero massacrar as pessoas que inexplicavelmente continuam a perder tempo com estes disparates.
No entanto, gostaria de partilhar a minha ida à recôndita vila de Mabomo, Distrito de Mabalene, Províniva de Gaza.

Antes de contar esta minha viagem, penso que fará algum sentido explicar o porquê desta minha deslocação. Ora a empresa onde estou a estagiar cá em Moçambique, a Self Energy, está relacionada com a área das energias renováveis. Complementarmente a isto, o FUNAE (Fundo de Energia Moçambique) decidiu lançar um projecto, com o auxílio de fundos europeus, para a electrificação, através de painéis fotovoltaicos de 50 vilas situadas em Moçambique e que não possuam energia eléctrica. 

A Self Energy ficou então responsável pela electrificação desta vilas e eu, enquanto mero funcionário e estagiário, estou responsável por fazer algumas visitas técnicas a avaliar necessidades energéticas e também alguma direcção de obra, coisas de homens, portanto.

Gosto de olhar para isto como um trabalho humanitário com a vantagem de ser remunerado. Bem vistas as coisas, eu devo ter o melhor emprego do mundo! ;)

O rendview ficou para as 6h na rotunda da OMM (Organização das Mulheres de Moçambique). Fui com um taxista daqueles nada flexíveis que baixou a parada dos 300 Mts para os 200 Mts. Ao chegar ao destino encontro-me com outro colega de trabalho e com o motorista (o grande Artur) que nos ia levar.

A carrinha que nos ia levar tinha todas as condições necessárias para chumbar na inspecção à distância, no entanto pareceu-nos a escolha ideal para fazer a viagem de mais de 8 horas com painéis fotovoltaicos e restante material eléctrico em cima. Mal me sento coloco-me à frente no meio dos bancos entre os outros dois viajantes e descubro que não tenho cinto. “Rebentou uma vez” diz o Artur o que me deixou logo descansado sabendo que em caso de embate poderia viver o jogo Angry Birds na óptica dos passarinhos.

Partimos então na nossa viagem. Os primeiros 300 kms passaram-se de forma mais ou menos tranquila com uma operação Stop de 20 em 20 kms e ao sermos mandados parar logo na primeira por o Artur não levar cinto. 100 paus, um polícia calado e a viagem prossegue.
Chegando a Chokwe a coisa começa a complicar, as estradas em alcatrão começam a apresentar alguns buracos atrasando assim a nossa marcha. Mas a coisa torna-se mesmo violenta nos últimos 20 kms entre Mabalane e Mabomo. Aqui, carreiro, apresenta-se como um sinónimo demasiado simpático para definir aquilo que assentava debaixo das rodas da camioneta. Desde inclinações, a buracos, passando por areia, havia de tudo para andarmos a baloiçar lá dentro e dar 368 cabeçadas no vidro da carrinha.

Posso dizer que entre Chokwe e Mabomo (100 kms) demorámos 4h30, mas que foi aqui que me apercebi que há toda uma outra realidade para além de Maputo. As pessoas aqui são mais abertas, mais simpáticas, claro que há sempre um ou outro com o olho para o negócio do fazer dinheiro fácil, mas nota-se que há aqui um sentimento humano diferente! As pessoas pedem boleia a qualquer carro que passe (sim, porque aqui é costume dar-se boleia nem que seja na parte de trás de uma carrinha de caixa aberta a alguém que precise… Mas depois os civilizados somos nós…). Infelizmente não podíamos dar por estarmos demasiado carregados, pelo que acenava-mos e as pessoas percebiam, sorriam e acenavam de volta.

Durante o caminho assiste-se a uma autêntica lição da fauna e flora Moçambicana. Desde camaleões, a cabras, passando por vacas com um estranho apetite de enfrentar a carrinha culminando em cobras onde me dão o seguinte aviso “fecha as janelas que as mambas costumam saltar para dentro dos carros”.

O auge desta viagem deu-se mesmo quase a chegar à vila quando nos perdemos e ficámos atolados no meio de nenhures sem rede nos telemóveis. Não fosse um senhor que trabalhava na África do Sul estar a sair naquele instante e ainda hoje lá estava a tirar areia às pazadas…
A chegada à vila foi qualquer coisa de mágico, a começar pela recepção:


Esta, faço questão que seja a primeira foto a publicar no meu blog pois sinto que isto é a verdadeira essência humana. Aqui não há segundas intenções, não há maldade nem mesquinhices. As pessoas são puras, são aquilo que são e tentam ser felizes com o muito pouco que têm…

Ok, há uma pequena imprecisão nesta imagem. Esta não foi a primeira impressão que tive da vila. A primeira visão surgiu quando ao chegarmos à vila um grupo de crianças vem a correr em direcção à carrinha a sorrir e a acenar. Infelizmente não tinha a máquina comigo, pelo que essa vai ser sempre uma fotografia que irei guardar apenas na minha memória.

Depois desta recepção tão boa, fiz a minha visita à vila, onde pude assistir a casas feitas em madeira, em alvenaria, salas de aula que me fizeram remontar às minhas salas de aulas da 2ª classe com os quadros pretos, as carteiras dos miúdos em madeira, e onde assisti acima de tudo, um calor humano único e amistoso especialmente vindo dos mais “piquenos” (como diria a Manuela Ferreira Leite).

Lamechices à parte, o resto da visita correu bem. Fomos interpelados por um senhor claramente movido pelo efeito do “mata-bicho” que começou por nos chamar “mulungos” mas que depois riu-se e foi-se embora a cambalear (tarefa aliás que se tornou extramente complicada); por outro senhor que teve o tempo todo da visita a olhar para nós até que no final veio ter connosco e pedir para tentarmos “arranjar um bocadinho de electricidade para a loja dele”; Tive a oportunidade de entrar nas cabanas onde fiquei agradavelmente surpreendido ao ver que apesar de tudo, as pessoas ainda vivem com o “algumas” condições de conforto; E até de assistir ao dj local colocar um cd numa aparelhagem e as pessoas da vila, principalmente os mais novos a ajuntarem-se à volta da cabana para assistirem ao “concerto”.

A vida na vila é do mais pacato que possa existir, as mulheres estavam de volta da roupa e o do jantar, os homens jogavam às cartas e conversavam e as crianças brincavam ora com aros de rodas de bicicletas, ora a inventarem danças.

A viagem de regresso correu de forma muito menos atribulada, saímos da vila por volta das 16h30 e chegamos a casa por volta da 1h da manhã. Cheguei a casa cansado, exausto e com um dor de costas horrível, mas por dentro muito mais completo…

Algumas fotos da vila e do passeio:






sexta-feira, 1 de junho de 2012

Segunda semana


Confesso que não era para escrever mais que aquele primeiro post. Não é por mal, é preguiça mesmo. Só que depois de ter sido ameaçado de castração química por parte de algumas pessoas que estranhamente ainda se preocupam comigo, vi-me forçado a escrever mais este capítulo. Aviso desde já a minha possível descendência que provavelmente não passaram de um plano por consumar pois não conto continuar a alimentar este vício do blog muito tempo. Aviso também que como tudo na vida, o primeiro post é certamente melhor que este, que o terceiro será ainda pior que o segundo e assim sucessivamente. Como tal, e para quem estava esperançado, pode desde já iludir-se pois ainda não vai ser desta que escrevo alguma coisa decente.

A primeira semana acabou com uma ida a um bairro de Maputo onde finalmente obtive um cheirinho da verdadeira África! As estradas em terra sem pavimento, o comércio local feito em casas compostas por materiais o mais surpreendente possíveis, os putos na rua descalços a correr na rua atrás de pneus e uma simpatia demasiado calorosa com o pessoal a chamar sempre “Oh Mulungu (branco em Chengane)!” apenas para darem um olá. Por momentos confesso que me senti mais importante que o Casimiro dos Plásticos.

As sextas-feiras à tarde em Moçambique são surreais e extremamente ineficientes, desde o simples facto de chegar ao pé de um fornecedor às 15h, pedir-lhe um determinado material e ele responder-me “Chefe, é Sexta à tarde, já fechei o computador!” até ao encontrar um funcionário a cambalear e perguntar-lhe se está bêbado ou anda a fazer buracos na areia ao que ele responde “eu não estou bêbado, eu almocei foi bem!” acontece de tudo.

No final do dia organizou-se o jantar de recepção ao João Venes outro INOV acabadinho de chegar e também ainda a adaptar-se a toda esta realidade (penso que já só faltam chegar 2). Fomos jantar a um restaurante tipicamente português cujo dono (Sr. Vitor) era tipicamente português e como tal, tipicamente forreta para quem de um momento para outro e sem contar com isso, ficou com uma casa cheia com a entrada de um grupo de 20 pessoas.

A noite rolou pelo CFM, que para quem desconhece, é a estação de caminhos de ferro cá do sítio que à Sexta e Sábado à noite se transforma num bar com um dj a passar músicas desde a Lambada, passando pelo Beautiful Lie do Ioav até aquele grande hit, Ana Júlia (coerente no estilo portanto). O espaço é engraçado mas é composto maioritariamente por portugueses o que dificulta um pouco aquela parte de conhecer a cultura local. O facto de ser um bar numa estação de comboios deixa-me sempre confuso pois não consigo deixar de olhar para os carris à espera do intercidades das 6h43 com destino a Chigubuta.

No dia a seguir de manhã, tive de me levantar cedinho porque os donos da casa iam lá buscar os pertences deles. Confesso que me doía um bocadinho a cabeça, não muito, mas o suficiente para quase maltratar os “ajudantes” que não faziam mais que estar à espera que o elevador descesse com os sacos que aqui os “mulungos” carregavam lá para dentro.

4 horas depois estava tudo descarregado e eu e o Néné fomos falar com a senhora da limpeza. Sim, nós vamos ter uma senhora para nos tratar da roupa e da comida, habituem-se! A senhora de seu nome D. Isabel (lembrei-me logo da mulher a dias da minha avó) pareceu simpática e prestável. Claro que como qualquer moçambicano fez o velho choradinho tão banal por estas bandas de que é viúva e tem 4 filhos para criar e que o cão está com uma depressão, o periquito com um reumatismo crónico, and so on… Ficámo-nos pelos 3.500 Meticais mensais (cerca de 100€) já com o transporte incluído. Torceu o nariz, mas é bem melhor que o salário mínimo.

Depois fomos para casa que íamos lá ter alguma malta a ver a selecção da Macedónia jogar contra outra selecção qualquer (há quem diga que era a selecção nacional, eu sinceramente não acredito nisso). Entre várias discussões chegou-se à conclusão de que a Académica era o melhor clube do Mundo e que o golo do Marinho no final da Taça de Portugal foi o golo mais bonito da história (é possível que se tenha chegado a outra conclusão, mas eu é que estou a contar a história, por isso eu é que sei!).

Depois do jogo jantou-se, bebi finalmente um bom copo de vinho tinto e fomos confraternizar para o Dolce Vita (um bar com bom aspecto e que volta e meia tem música ao vivo). Claro que depois disso deveria ter ido para casa, mas como bom amigo que sou do Luciano, não o queria deixar ir sozinho e então fomos ao Ice. 

O Ice fica ao lado do Coconuts (maior discoteca de África) e tem um aspecto nada a ver com a realidade rural. Toda a gente está bem vestida, toda a gente tem dinheiro, as pessoas parecem saídas de um qualquer catálogo de moda africano e paga-se a módica quantia de 500 Mts para entrar (o salário mínimo relembro que ronda os 3.000 Mts). Entre algumas peripécias (que vou obviamente ocultar porque a minha mãe ao que parece lê isto e vai contar ao meu cão) posso dizer que eu e o Luciano éramos os mais maltrapilhos lá do sítio mas que mesmo assim não pagamos entrada. Não interessa como, há segredos que devem ser bem guardados, mas garanto que não houve qualquer tipo de favor sexual envolvido à mistura.

No final da noite fomos comer ao Psiocológico cá do sítio que mais parecia um local de transacção de estupefacientes. Entrámos num beco onde está uma pessoa atrás de um gradeamento apenas com um pequeno espaço que claramente servirá para a passagem de objectos. Aconselham-nos a pedir meia galinha e assim o fazemos. Dão-nos um saco azul para a mão e pedem-nos 70 paus (pouco mais de 1€). Neste momento senti-me uma verdadeira Fátima Felgueiras.

A nossa casa nesta noite parecia um verdadeiro albergue juvenil com o dobro das pessoas residentes a dormirem por lá, desde desterrados oriundos da Matola (que fica a 20 kms de Maputo) passando por pessoas com problemas de locomoção e de capacidade cognitiva, havia de tudo portanto!
Na manhã seguinte os donos da casa voltaram para tirar o resto das coisas. O tempo de espera moçambicano é claramente diferente do europeu. Pelo menos em Portugal quando nos dizem que demoram só 15 minutos não aparecem apenas ao fim de 2 horas com um sorriso na cara (excepto eu, claro).

Confesso que fiquei mesmo feliz quando saíram, pude finalmente arrumar as roupas! É que o ter de andar sempre a revirar sacos e mais sacos em busca de qualquer coisa já me estava a irritar um bocado. Sentia-me um verdadeiro Indiana Jones em busca de qualquer artefacto sempre que queria procurar um simples par de meias.

Depois de terem saído fui dar uma volta a conhecer um pouco mais da cultura local, e o que é que uma pessoa faz quando quer conhecer a cultura local? Vai para uma tasca!! Após o efeito tasca fomos jantar a uma feira de artesanato com comidas típicas, música ao vivo, danças, o povo moçambicano anda sempre em festa como se deve imaginar.

Os moçambicanos primam muito o sair no Domingo ao final do dia. Encontram-se todos numa tasca ou mesmo em plena rua, abrem as malas dos carros e ficam até tarde a beber cerveja e a ouvir música. Penso que eles gostam mesmo de dar sentido à frase “I hate Mondays”.
A meio da semana assisti pela primeira vez a chuva desde que cá estou. Claro que até o raio do clima tinha de ser diferente! Conseguia ouvir a chuva a cair, conseguia ver alguns pingos, mas não me chovia em cima… Era como estar a viver uma mini tempestade tropical a acontecer à minha frente sem me molhar! Claro que este momento foi raro pois normalmente o tempo por estas bandas é solarengo. Se bem que um Sol um pouco alternativo. Não existe aquela luz radiante a acompanhar um céu completamente azul. O céu aqui é solarengo, mas parece que está sempre coberto por uma leve névoa cobrindo a cidade daquele tom avermelhado e quente tipicamente africano. Outro exemplo do estranho clima de cá aconteceu logo nos primeiros dias com os termómetros a acusarem 32º C mas, devido a toda a humidade e por ser uma cidade costeira, andava-se tranquilamente na rua. Nem sempre vai ser assim, garantiram-me.

O final da semana acabou de uma forma mágica com a visita à pequena vila de Mabombo situada a mais de 300 kms de Maputo. Mas esta aventura merece que dedique um post exclusivo.

A semana correu bem, as saudades de casa começam obviamente a causar a sua mossa mas a adaptação a toda esta nova realidade com o espirito Moçambicano incutido começa a interiorizar-se. Continuo na minha luta atrás de um guitarra feita por algum artista local e também a luta dos rapazes do Inov por uma futebolada. 

Apesar de ser tudo estranho e diferente penso que vamos gostar desta aventura, aliás, tantos e tantos portugueses ficaram por cá é porque que esta terra tem mesmo algo de mágico para oferecer. Não desanimando e uma mente aberta e estou certo que encontraremos essa magia mais cedo que do que estamos à espera!