sexta-feira, 13 de julho de 2012

Sim Rita, eu sei que já passaram duas Sextas e ainda não actualizei o blog, mas diz que isto de andar perdido pelo meio do mato de Moçambique tem alguns inconvenientes sendo um dos quais o não haver acesso à internet!

Adiante, tive a minha primeira semana no mato à Indiana Jones mas em vez de chicote tinha uma navalha e uma bussola… Objectivo da viagem, visitar as vilas de Chiputo, Zâmbuè e Tonguè. Não, não estou a tirar bocados de massa de uma sopa de letras e a misturá-las a tentar criar nomes, as vilas chamam-se mesmo assim!
Parti numa Segunda-Feira onde às 5h30 já estava em grande forma, depois do fim-de-semana mal dormido na Ilha da Inhaca (sobre o fim-de semana em Inhaca não vou falar, se quiserem perguntem a quem lá esteve), no aeroporto internacional de Maputo para apanhar o meu voo com destino a Tete.
O aeroporto, curiosamente, já não me pareceu tão mau desta vez. Parecia uma coisa muito mais organizada e até conseguiu reparar que estão a construir uma ala nova. Claro que tinham de ser os chineses a construir e claro que que já lá estão duas torres com todo o aspecto oriental. Até as placas de segurança estão escritas em Mandarim o que deve ser de bastante utilidade para os trabalhadores moçambicanos. Há quem lhe chamam de globalização, eu prefiro o termo “conquista territorial”…
Cheguei a Tete por volta das 9h num voo em que o piloto tinha competências natas para as aterragens mas que tinha tanto jeito para as curvas como o Pedro Lami num F1. Estive cerca de 1 hora à espera das malas e é aí que encontro o Sr. Tomé, o motorista que me ia andar a conduzir durante os próximos 5 dias.
Do aeroporto fomos directos ao FUNAE ter com o Eng. Militão que também iria fazer as visitas connosco. Confesso que aqui tremi um bocadinho… É que não conseguia parar de associar o nome Militão ao outro que andou entre aqueles portugueses em Fortaleza, no Brasil. Ao que parece este não era nenhum visionário na arte da indústria cimenteira e do betão o que me tranquilizou. Após os cumprimentos formais seguimos viagem…
O primeiro destino era Fingoè onde iriamos pernoitar pois era a meio do caminho. Sim apesar de ter vindo de avião, ainda tinha mais de 500 kms pela frente em estradas onde eu não metia uma manada de vacas (que há várias) quanto mais a nossa 4x4.
Chegámos a Fingoè, depois de uma curta visita por Chiputo, já de noite e decidimos ir a uma barraquita de uma senhora comer qualquer coisa. Pedimos uma galinha com chima que demorou cerca de 2 horas e após muita pressão exercida da nossa parte (foram literalmente matar a galinha para nós).
Jantados, porcos e cansado deslocamo-nos para a pensão. Fiquei num quarto com casa de banho privativa e tudo! Luxo, penso eu hoje… Decidi tomar um banho mas reparo que o chuveiro apenas tinha uma torneira e não tinha água quente... Decido reportar este facto ao rapaz da pensão que olha para mim, ri-se e desaparece! Gajo porreiro, penso eu… Volta passados alguns minutos com um balde cheio de água quente e uma caneca. Ainda esperei que viesse um casal de arias para me banharem como no tempo da Roma antiga mas foi pura ilusão.
Entre deitar-me cheio de pó que se impregnava em cada poro do meu corpo ou o balde e a caneca com aspecto francamente duvidoso que no que a higiene diz respeito, optei pelo banho! Ah homem! Vou para me deitar e reparo que o lençol da cama mais parecia uma cena tirada do CSI onde não seria preciso a luz negra nem a lupa para encontrar as provas do crime. Por sorte, ou vá por aviso do pessoal antes da minha partida, tinha levado o meu próprio lençol, um saco cama e a minha rede mosquiteira.
No dia seguinte arrancámos em direcção à segunda vila. Fomos directos à chefe do posto administrativo (funciona como a chefe da vila) que não estava. Tentei então falar com a secretária dela onde estive 10 minutos com a senhora a acenar e a sorrir como se absorvesse cada palavra. No final pergunto se percebeu o que eu disse ao que ela me responde com um sorridonho “Não!” Não fosse o Militão a falar Chona (dialecto de Tete) e ainda estava lá hoje.
A visita correu dentro das normalidades com praticamente todos os habitantes e pedir-me para lhes instalar pelo menos uma lâmpada na barraca feita de palha. Tentei explicar que a coisa não era assim tão linear, mas este foi um processo claramente em vão.
A meio da tarde seguimos para Zumbu onde iriamos dormir. O caminho até Zumbu pura e simplesmente não existe… Penso que só por uma vez passámos os 40 km/h nos mais de 100 kms que fizemos. Ainda passámos por um camião que devido ao peso tinha conseguido a proeza de desabar uma ponte dos anos 60. Morreu uma criança que ia na parte de cima com a mãe.
Chegados a Zumbu somos recebidos pelo Sr. Vítor, dono da pensão, e claramente o R.P. lá da vila. Prontamente nos mostra a vila e todo o progresso que estava a ser alvo. Desde a maternidades, centros de saúde, enfermarias, jardins, grande parte da vila estava em construção com o sem que ninguém conhecesse a origem dos fundos que estavam ali a ser investidos. Devo referir que Zumbu fica na fronteira entre a Zâmbia e o Zimbabué e que é usada como posto fronteiriço e de controlo migratório. É de resto uma visão lindíssima estar em Zumbu e ver o rio Zambeze a dividir duas montanhas sendo que de um lado corresponde à Zâmbia e do outro o Zimbabué e ver ainda o afluente deste mesmo rio a dividir Moçambique dos seus dois países vizinhos. Forma-se ali um delta tropical rochoso muito bonito. Eu sei, devia ter tirado fotos…
O Sr. Vítor estranha a minha forma de falar e desconfia que seja português (uma constante aliás desde que ando por Moçambique). Informa-nos ainda que há um leão que todos os dias às 16h da tarde passeia pela rua principal da aldeia o que me colocou logo num misto de perplexidade. Por um lado estranhava a enorme pontualidade do leão, por outro o facto de poder ter de viver de perto uma daquelas perseguições do National Geographic vista do lado da presa.
Jantamos um belo peixinho (Pembe) com chima (estou viciado nisto) e vou para o quarto por volta das 19h da noite. Mal abro a porta vejo uma osga grande e gorda a rastejar pela parede. Fome não ia claramente passar…
Ainda pensei tomar um banho rápido antes de adormecer, mas rapidamente me apercebi que o quão luxo era aquilo do quarto banho privativo e que para tomar banho teria que ir a um anexo que tinha uma simples parede demasiado baixa a servir de separação. Deixei o banho para de manhã, se é para andar nú à frente de toda a gente, ao menos que gente com luz para se ver bem.
Lá dormi eu com o meu amigo Lagarto (não confundir com o Pedro Lagartixo por favor) e arrancámos ainda de madrugada para Tonguè. No caminho decidimos ir por um atalho (o que aliás é uma excelente atitude quando se anda pelo meio do mato) que se dizia ser composto por leões e elefantes e que volta e meia alguns se lembravam de atacar os carros. Bámos (como diz o outro) lá então! É de adrenalina que o meu povo gosta!
Chegando ao destino… Nada, nem um bocadinho de marfim a perfurar o chassis da carrinha, nem uma cicatriz de mordidelazita de um felino para mais tarde contar aos netos, não vi nada de animais selvagens, quer dizer…Espera, vi um cão, estava na selva, ok, vi um cão selvagem!
Visitamos a vila e voltámos para Fingoè para pernoitar. Tentámos falar com uma senhora oriunda do Zimbabué que nos tinha servido o pequeno-almoço na manhã anterior na tentativa de nos arranjar algo para cear, mas em vão pois segundo a própria, já não tinha mais nenhuma galinha para matar (ai se ainda tivesse aquele lagarto à mão). Recorremos então ao outro que demorava duas horas a servir se bem que desta vez tentámos uma abordagem mais prudente; chegámos ao local às 18h30, pedimos uma galinha e dissemos para mandar um toque para o telemóvel quando tivesse pronta que iríamos estar pela pensão a descansar. Entretanto, chegam as 20h30 e a rede da Mcel (é tipo a TMN cá do sítio)tinha ido em vulgo português, com os cães. Tomámos então a sensata decisão de ir até ao restaurante na esperança que a dona já tivesse a trepar paredes desesperada por não nos conseguir ligar. Hum hum, puro engano… “Está quase!”, informa o marido da senhora. O “quase” durou até às 21h30 altura em que nos fartamos e rumamos aos quartos cheios de fome e com o orgulho ferido. No dia seguinte o Militão informa-me que tinha recebido uma mensagem com o seguinte texto “A comida está na mesa”. Eram 22h30, sim, 4 horas é o tempo de preparação de uma galinha naquele estabelecimento. Claramente não está a tentar concorrer para nenhuma estrela Michelin…
Na manhã seguinte deslocámo-nos para Tete onde iria ter de fazer alguma prospecção de mercado (e o que eu adoro fazer trabalho de comercial??). Fiquei na estalagem Zina Pipia que, apesar de não ser melhor que um qualquer motel situado na IC2, pareceu-me um verdadeiro Hotel Ritz. Claro que tomar banho também era usando a técnica da caneca, tinha mais mosquitos que uma fossa de céu aberto e os lençóis parecia que tinham sido usados e virados do avesso, mas fora isso tinha ar condicionado, TV com um canal bastante interessante onde estavam sempre a passar filmes e um restaurante que dava para petiscar qualquer coisa e até assistir ao Portugal x República Checa.
Obviamente que em Moçambique assistir a um simples jogo de futebol tem o seu quê de aventureiro. Chegada à hora do jogo a minha pessoa decide deslocar-se para o restaurante na tentativa de ver os miúdos a darem uns toques na bola. Sento-me ao balcão (sou tuga ou não sou?!?) e peço um prego no prato e um 2M (fino para o pessoal do Norte / Centro, imperial para aquela malta abaixo do Mondego com a mania que têm direito a uma cerveja especial). A dona dormia, como aliás o fazia à hora do almoço, pelo que tive de a acordar de forma delicada com um “OH FACHAVOR!!”.O café estava à pinha e curiosamente desta vez os moçambicanos até torciam pelos lusos. O pessoal bebia cerveja, comia e fazia despesa para a casa até que chega o intervalo.
Ainda estava eu a digerir aquelas bolas todas ao poste e a pensar pedir outro FINO quando a senhora dona do estabelecimento acorda e pergunta “já acabou?”. Expliquei-lhe que não que era intervalo e que ainda havia outra parte de 45 minutos. “Ahh” diz ela, “Vamos embora!”…Ficou o café todo perplexo a pensar como é que alguém era capaz de fazer uma coisa daquelas num jogo daqueles ainda por cima com a casa cheia e pessoas ainda a jantar. Tentámos motivá-la, alguns quase à força mas em vão.
Decido então não perder mais tempo com aquilo e frustrado, nervoso e irritado decido tentar arranjar outro poiso para ver o resto do jogo. Peço ao recepcionista para me chamar um táxi que me diz que aquela hora já não havia táxis. Por sorte estava um parado mesmo à porta da pensão que me leva a uma pastelaria muçulmana que, para não variar, não vendia álcool (acho que são alérgicos). Sento-me ao lado de um senhor também português mesmo a tempo de ver o golo do Ronaldo enquanto bebia uma angustiante Coca-Cola…
No dia seguinte tinha o avião para Maputo. Os comandantes obedecem ao bom estilo moçambicano e chegam 1 hora atrasados sem qualquer tipo de aviso. Entro no avião e ainda estava eu a pensar em que fazer durante 2 horas quando se sentam três indivíduos bastante animados ao meu lado. Conversa para aqui, conversa para ali chego à conclusão que estão bêbados… Esta foi uma conclusão que cheguei rapidamente quando a hospedeira os mandou calar três vezes e quando eles me decidiram pagar whiskeys… 137 avisos e depois de descobrir que afinal um deles até trabalhava com a minha empresa, aterramos em Maputo em que a primeira coisa que me vem à cabeça foi “Estou em Nova Yorque!”
Entretanto chego mesmo a tempo de ainda apanhar o pessoal que ia de fim-de-semana para o Tofo. Sobre o Tofo não há muito para dizer porque sinceramente não me lembro de muito. Sei que se criou um Irmandade de pessoal que arriscou a vida a ir à praia do Tofinho onde mais uma vez o João Vieira não esteve presente, que a Rita Russo diz que é campeã nacional de senhoras de Bridge (é assim, não é?) mas que no diz respeito à sueca e ao king não passa dos campeonatos regionais, que andam baleias brancas à solta pela praia do Tofo, afinal Moçambique tem praias com ondas, que as capacidades de organização e planeamento da Patrícia Lima continuam espectaculares, por falar na Patrícia Lima, é a única pessoa que conheço em que pomos o mp3 em modo aleatório e toca quase sempre a mesma música… Vá, tenho também que dar uma palavra de apreço à Romina que conseguiu arranjar uma carrinha para nos levar  que tinha impresso na traseira “Hell Boy” (não sei…); de salientar ainda o nosso entertarneir João Venes com a sua capacidade única de contar anedotas e de nos animar com cantares alentejanos e que o Dino morreu… Quem é o Dino? Não sei, mas há todo um bar dedicado à sua morte que eu e o Luís conseguimos reservar para os Inov’s que infelizmente preferiram ficar a jogar cartas… Não há respeito, nem pelo Dino… Já agora, foi muito bom ver o Luís e o Charles como dj’s de serviço, mas era melhor se alguém lhes cortasse o cabo de alimentação da mesa de mistura ou das colunas.
E pronto, não me alongo mais porque já sei que isto está muito grande e que o pessoal mal abre pensa que é grande e que lê depois e que eu sou uma besta e mais não sei quê. Agora estou por Quelimane onde passei mais 15 dias no mato, se bem que para isso dedico outro capítulo. Só espero chegar a Maputo e ainda lá estarem pessoas…

Estamos juntos!