sexta-feira, 25 de maio de 2012

Primeira semana - Partida / Chegada e chapada inicial


A pedido de várias famílias, como quem diz da minha, decidi então aventurar-me nisto dos blogs para ir dando algumas notícias acerca desta minha aventura por Maputo.
Confesso que planeava ter começado há mais tempo, mas o acesso à internet tem-me sido vedado fazendo-me sentir como um autêntico habitante da Coreia do Norte. Mas heis que ao fim de uma semana consigo ter acesso à net.
Após ter lido os meus 250 mails, mais as minhas mais de 100 notificações facebookeanas entre outros, cheguei a uma conclusão iluminada (como tudo o que faço aliás), uma pessoa já não aguenta mesmo sem conseguir dar uma espreitadela na internet volta e meia… Sentia-me um verdadeiro junkie com tremores e a coçar-me todo ansioso por ver quantos convites já teria nesta altura para o Hidden Chronicles…
Para quem não sabe porque estranhamente continuo a receber mensagens a combinar café entre outros convites (alguns mesmo diria que assustadores), EU ESTOU EM MAPUTO, QUE FICA EM MOÇAMBIQUE, QUE POR SUA VEZ SE SITUA EM ÁFRICA! MESMO CÁ EM BAIXO! SIM, EU SEI QUE É LONGE! Ou seja, a menos que queiram combinar um café ali no cantinho do Shopping do Polana, não vou! Epá evitam, não vou mesmo! Não é má vontade, acreditem.
Falando então na partida, queria antes de mais agradecer a todos aqueles que me conseguiram por com as lágrimas nos olhos, tal e qual como um bebé grande, no avião com todas as mensagens e chamadas sentimentais e de apoio. Um dia vingo-me, vão ver!!
A viagem até foi tranquila, o avião devia partir de Lisboa rumo a Frankfurt às 16h40 mas estava 20 minutos atrasado (este é dos meus, pensei logo). Lá entrei no bicho e senta-se ao meu lado um casal de preguiças daquelas já velhinhas que mal se sentaram adormeceram e não acordaram nem quando aquilo aterrou…
Chegando a Frankfurt encontrei-me com o Jaime, o Néné, o Mário, a Bárbara e o Daniel (tudo malta de boa fé, não te preocupes mãe) e após termos feito o check in atacamos logo o bar do aeroporto enquanto mirávamos o boeing 777 de dois andares que nos ia levar para Joanesburgo. A viagem faz-se relativamente bem, apesar de não se ter muito espaço para se esticar as pernas, mas o facto de servirem umas belas refeições com bom vinhinho, whiskey e de uma pessoa ter acesso a um lcd individual com uma série de filmes bastante recentes e jogos ajuda a passar as 12 horas de voo (diga-se de passagem que cerca de 6 dessas horas passei-as a dormir).
O voo chegou a Joanesburgo com cerca de 15 minutos de atraso (eu devia mesmo ter ido para a área da aviação) o que fez com que perdêssemos a ligação para Maputo, um telefonema de mais de 30 minutos e muita paciência depois, lá nos arranjaram uma ligação que era cerca de 3 horas depois. A espera no aeroporto deu para várias coisas, tirar uma foto com Nélson Mandela, almoçar e ver a Bárbara a ser pedida em casamento pelo senhor da segurança. Na altura foi algo que me pareceu estranho, hoje já não. E pronto, 23 horas depois, mais de 9000 kms e duas escalas em países totalmente diferentes lá chegámos a terras Moçambicanas (medo).
A chegada a Maputo foi no mínimo estranha, o senhor da alfandega pediu-me uma “ajuda” para não me ter que abrir as malas, calando-se por uns abusados 4$. Depois tive que ir para a empresa do Daniel ver se o patrão dele me arranjava um sítio para ficar uns dias.
Maputo, diga-se desde já não tem dos melhores cartões-de-visita quando se sai do aeroporto. O caminho até à empresa (Terra Mar) foi desolador onde vi praticamente todas as formas possíveis que o ser humano utiliza para sobreviver quando não tem dinheiro nem comida.
Chego à Terra Mar e a primeira coisa que reparo são dois seguranças à porta do supermercado cada um com uma espingarda na mão. Nesta altura comecei a fazer conta aos dias que faltavam para regressar e a pensar em criar uma revolução que obrigasse a expatriação de portugueses como aconteceu na Líbia.
É então que conheço o Quinn, Sul-Africano que não pesca uma palavra de português, uma celebridade qualquer no país dele por ter entrado no Big Brother Africano e que está temporariamente a viver num apart-hotel pago pelo patrão dele enquanto não lhe arranja uma casa mais definitiva. Entrando no condomínio as coisas melhoraram bastante, tivemos lá a beber umas jolas a falar sobre futebol e a conhecermo-nos melhor. O facto do patrão do Daniel ter pago o jantar e de haver lá uma festa da Movotivel (é tipo a Optimus cá do sítio) que estava repleta de africanos e asiáticos ainda facilitou mais a adaptação.
Os primeiros dias a sério em Maputo foram dedicados à procura de casa a tentar conhecer melhor o pessoal, a cidade e a adaptar-me à realidade Maputense. Isto não é uma cidade muito fácil para quem não tem estomago forte, quase tudo é negociado, somos constantemente abordados por pessoas a pedir dinheiro, comida ou a quererem vender bugigangas (o que derrete o coração da nossa Madre Teresa de Calcutá, a Romina) e depois claro há os polícias que mandam parar tudo o que é carro com brancos no interior à procura de “refrescos” (como lhes chamam por cá aos subornos).
O resto da cidade em si é um misto de Ocidental, Africano, Muçulmano e já se nota alguma influência Oriental. É notório que já houve aqui uma cidade muito bonita e desenvolvida que se ficou pela guerra colonial e que neste momento partilha o seu lado degradado com alguns investimentos externos. Os edifícios estatais são todos enormes e recentes, a casa do presidente tem cerca de de 1km de largura e os prédios parecem ter sem-abrigos a dormir à porta que não são mais que os seguranças do prédio, sujeitos estes com uma envergadura capazes de meter medo a qualquer gang de formigas que decida andar a roubar roupa e equipamentos electrónicos das casas.
Um aparte, a maior parte dos assaltos às casas dá-se com a total conivência dos seguranças ou das empregadas domésticas, o que deixa qualquer um a sentir-se muito mais seguro! (Já agora deixa ver o que quer dizer conivência. Hum… ok, pode ser!). A praia até é bonita, mas nadar num sítio onde uma pessoa manda um mergulho e arrisca-se a perder um bracito por causa do escoamento dos esgotos, não está para já nos meus planos. O trânsito é caótico e o pessoal gosta de apitar por duas razões, por tudo e por nada. Com uma diferença, enquanto que em Portugal o pessoal stressa, aqui ignoram, por vezes riem-se e seguem em frente.
Acerca da cultura, comida e noite ainda não posso dizer muito porque infelizmente ainda só fomos a sítios mais turísticos onde vinga o espírito tuga e capitalista. Posso dizer que o pessoal aqui gosta de peixe e que todos os pratos vêm com batata frita, que almoçar, jantar e sair aqui à noite não é barato mas que dá para um gajo se estragar na mesma (por falar nisso, ainda estou chateado com o Luciano e a Romina, que já deviam saber que no que diz respeito a copos sou mais fácil que a Marta Leite Castro, e que aproveitaram-se disso e de shots de aguardente para me desencaminhar). O karaoke aqui é feito com uma banda ao vivo e as letras estão escritas num papel. É giro porque dá um ar de que somos mesmo artistas apesar de não cantarmos mais que o Rouxinol Faduncho.
Um conselho acerca do karaoke e em geral, não cantar “A minha alegre casinha” dos Xutos e Pontapés (nota mental e uma vez mais responsabilizo o Luciano e a Romina), nem dar muito nas vistas. Em primeiro lugar cantar esta música dá sempre muita segurança para qualquer artista, pois no fundo sabemos que até podemos cantar mal que todos os tugas emigrantes presentes vão cantar ainda mais alto que os microfones. Depois, ao dar nas vistas o pessoal (raparigas neste caso) daqui topa e assedia de uma forma muito directa e por vezes agressiva (que o digam as minhas costas das cotoveladas que fartei de levar de uma mulher-homem que quando se ria não se viam mais que três dentes).
Os transportes são engraçados, a opção existente é entre os táxis que têm de ser bem negociados, existem as txopelas que me faz lembrar aquelas motas que vendem peixe mas em vez da capota rígida possuem uma lona com bancos e que também têm de ser muito bem negociadas e por último existem as chapas, que são umas Toyota Hyace repletas de pessoas lá dentro (mais de 20 por vezes) e onde a única lei prevista é não serem permitidas partes do corpo no lado de fora da viatura, estas não sei se têm de ser bem negociadas pois não conto entrar dentro de nenhuma. Uma vez mais, não é por mal, é só porque acho que o meu top tem de ideias de m**** já está cheio o suficiente para acrescentar o “andar compactado numa lata de sardinhas motorizada com um cheiro capaz de enviar a fábrica de Cacia para a segunda divisão do campeonato nacional do olfacto profissional” à lista.
Outra coisa engraçada é o futebol. Os Moçambicanos são todos adeptos de um clube português e doutro inglês. Preferem o campeonato inglês e português ao deles o que foi óptimo para ver o Chelsea ganhar a Liga dos Campeões e para assistir aquela grande vitória da BRIOOOOSA na final da Taça onde até o Quinn já era Academista desde pequenino. Só um parenteses para todos os Academistas, já vi por aí o nosso Dário e ainda joga! Assim que puder vou assistir a um jogo dele. Também já vi por aí o Armando Vara o que é óptimo porque tenho aí uma série de sucata a ganhar pó e que já não sabia muito bem o que fazer com aquilo.
A procura de casa é uma aventura, as pessoas atropelam-se umas às outras a tentarem vender, os prédios por fora parecem saídos das piores zonas da Buraca mas por dentro até são “confortáveis”.
Gosto particularmente dos conselhos que dão ao pessoal que procura casa, nada de rés-do-chão e apenas procurar casas com gradeamento nas portas e janelas pelo menos até ao quinto andar. Diz que a malta daqui gosta de trepar.
Depois de muita negociação e do Jaime se transformar num Hulk mas com roupa e três contractos revistos lá nos mudámos para a nossa casinha nova onde vamos pagar a módica quantia de 2.000$ mensais (!!!!) num T3 com 4 pessoas e onde contamos com a presença de muita gente a ajudar a lavar a roupa, loiça e a fazer o jantar. Penso até que já há uma série de candidatos, espero.
A primeira noite na casa nova foi tranquila, a Patrícia mitrou-se lá na casa com direito a quarto privativo e tudo (ainda se queixam as mulheres dos direitos de igualdade) e dormir num beliche não é tão mau como se pensa, apesar de achar que mais cedo ou mais tarde aquilo se vai desmoronar. A casa podia ter melhores condições, mas neste caso estamos a pagar pela localização e pela vista fabulosa para o mar. Já sei que não vou ter fome porque há uma série de baratas a viver nas escadas do prédio e com um bocado de sorte ainda consigo um belo banquete de ratazana preparados pelo Néné e pelo Mário, excelentes cozinheiros, diga-se, mas com dotes ainda por aprovar pela minha pessoa!
O trabalho até tem sido engraçado (se bem que trabalho com dois benfiquistas daqueles que se desse, pintavam o céu de vermelho), pareço um autêntico operário a carregar material para a frente e para trás mas sempre dá para aprender alguma coisa. Os moçambicanos trabalham em duas velocidades, o parado e o “fica para amanhã” o que ajuda sempre muito quando uma pessoa tem pressa. Outra coisa, apesar de simpáticos, os locais daqui não sorriem muito para desconhecidos, principalmente para brancos, e a julgar como já vi alguns portugueses aqui a tratarem mal as pessoas e a por pensarem que têm o rei na barriga, dou-lhes toda a razão! Um pouco de simpatia nunca fez mal a ninguém e basta um sorriso que eles agradecem.
Para já até está a ser giro, claro que há sempre muita saudade presente de toda a gente que deixei para trás e da minha Coimbra mas, como isto todos os dias há uma aventura diferente, a coisa até vai dando para aguentar.
Pronto, já estou farto de escrever, estou um bocadinho cansado que isto com tanta festa, stress e trabalho ao mesmo tempo não dá para grandes escritas espirituosas.
Queria por algumas fotos, mas como normalmente a minha máquina teima em sair de casa deixo isso para outros profissionais como as Patrícias e a Sonieea que depois tenho a certeza me dão (uma vez mais, se algum dia me quisesse candidatar a um cargo político a minha exposição fotográfica destruiria logo a minha carreira mais depressa que o Marinho Pinto na Assembleia da República). Assim que possível vou actualizando a coisa.
Um grande abraço e um beijo ainda maior para todos!!!
Saudades pessoal!
Como se diz por cá, “Estamos juntos!” (Até já!)