quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Está quase...



Ora viva!!!

Tudo bem desse lado? Sinceramente não quero mesmo saber, mas achei que era simpático começar assim…

Estava aqui a falar com os meus botões (mas só com os de cima, que os de baixo são marotos…) e lembrámo-nos de que tínhamos um blog e que já não escrevíamos há algum tempo. 2 meses segundo a nossa Patrícia Cerqueira (desculpe chefinha)!

Isso é que deve ter sido para aí uma festança sem aqui o Zé Manel a melgar, hã? Aposto que até mataram porcos e sacrificaram galinhas para comemorar seus malandros! Pois bem, como tudo o que é bom passa rápido, estou de volta! Pimba! Agora aturam-me!

Vá… Na verdade nem era para escrever mais, apesar das constantes ameaças da Rita Russo (que como se sabe é das Amoreiras e como tal todo o cuidado é pouco), a preguiça era mais forte e depois chegou a um ponto em que já tinha acontecido tanta coisa que já nem sabia por onde começar…
Vou então relatar a minha última viagem pelo mato de Moçambique, uma vez que a minha memória de peixe rejeita informação armazenada há mais de 16 dias e assim é uma forma de me lembrar do que andei por a fazer pelas terras do “uncle Sam” (calma… não estou nos states! Este tio tem menos barba, é um pouco mais escuro e o Sam vem de Samora Machel). Preparem-se para mais um “open book” que isto 10 dias em Moçambique dá para acontecer muita coisa…

Desde já, sim, gostam tanto de mim cá na empresa que voltaram a mandar-me 10 dias para o mato… A viagem desta vez consistiu em visitar duas províncias, Sofala e Zambézia, total de vilas, 5, quilómetros, 6.000 numa Mahindra (uma pick up de origem indiana e que ao que parece é uma qualquer junção  de várias peças de outros fabricantes).

Saí num Domingo, meio ensonado devido à hora (5h30) e ao facto de me ter deitado tarde a fazer um trabalho para a AICEP e a espreitar o jogo do Porto. Fui com o meu colega Hugo que me ia deixar em Mapinhane para depois seguir viagem com o Milton (outro colega) até à Inchope.
A viagem de mais de 650 kms (é pequenino o país, não é?) revelou-se bastante mais curta que o previsto, uma vez que ao fim de apenas 200 kms a Isuzu (é outra marca de carros, também não sabem nada vocês…) onde íamos começou a verter óleo. Ficámos parados em Xai-Xai, o que não é mau de todo tendo em conta que tínhamos a praia mesmo ao lado.

Tivemos que procurar um mecânico, num Domingo, numa cidade quase deserta… Lá encontramos um rapaz cujo pai era mecânico, mas que também ele possuía umas luzes de dar com martelos em chapa. O rapaz e o pai lá conseguiram dar um jeito ao bólide de modo a que ele fizesse a viagem de volta para Maputo. Levar-me a Mapinhane estava já fora de hipótese pelo que o desgraçado do Milton teve de fazer todos os 400 kms para trás enquanto eu e o Hugo nos banhávamos e almoçávamos na paradisíaca praia de Xai-Xai.

Chegado o Milton, tivemos apenas tempo de trocar as coisas de um carro para o outro, comer qualquer coisa e arrancar para cima o mais a Norte possível dada a já escassez de tempo. Tomei então as rédeas do bicho e seguimos viagem. Conduzir na estrada Nacional 1 de Moçambique à noite, é uma aventura digna de um qualquer Indiana Jones ou Lara Croft. Desde pessoas a circularem na beira da estrada se não mesmo no meio da faixa de rodagem, que nem kamikazes nipónicos a tentarem uma operação suicida, e que pura e simplesmente não se veem (que bela chance que tinha agora para meter aqui uma a roçar o humor negro, hã?), a carros que vêm de frente sem luzes, apenas com um médio ou com os dois máximos numa estrada sem qualquer tipo de sinalização ou iluminação, passando por camionistas que possuem um qualquer sentimento de superioridade que lhes permite ocupar as duas faixas de rodagem, culminando nos habituais polícias que procuram todas as formas possíveis e imaginárias de obterem um pequeno “refresco”, há toda uma panóplia de eventos que afastam o sono e fazem-me pensar no que aconteceria em caso de acidente, uma vez que as únicas ambulâncias que vejo são aquelas que acompanham o Guebuza (El President) quando o menino decide ir ao pão ou assim. De salientar, nesta altura a Mahindra fazia um barulho estranho nas rodas da frente.
Ao fim de muito custo lá chegámos à bela localidade de Massinga onde pernoitámos e comemos qualquer coisa pois no dia seguir tínhamos de sair às 5h para nos encontrarmos com o Eng. Jemusse em Inchope. Senhor simpático este Jemusse, então se falasse era ainda mais agradável!
Assim que nos encontrámos com ele seguimos para Marromeu pois no dia seguinte fomos visitar as vilas de Maligapansi, Catulene e Chilóló (isto a nível de nomes estapafúrdios está forte!) que durante o tempo de chuvas as pessoas ficam 6 meses isoladas de todo e qualquer contacto com o exterior. Ainda hoje não consigo esquecer a cara do Jemusse a tentar segurar-se a toda e qualquer saliência que o carro tivesse enquanto cavalgávamos aquelas estradas em areia a 100 km/h com a carrinha a fugir por todo o lado.

A caminho de Maliganpansi surgiram duas histórias engraçadas, a primeira foi termos perdido o pneu suplente da carrinha. Don’t ask me how, pura e simplesmente saiu e foi à sua vida. Cá para mim estava tão farto da estrada sinuosa como o Jemusse. Chegados lá deparámo-nos com duas senhoras que nos pediram para levar duas crianças doentes para o Centro de Saúde mais próximo. Disse-lhes para subirem para a parte de trás da carrinha e lá as levei até Marromeu, a eles e a um outro oportunista que decidiu aproveitar a boleia para a “cidade”.
Passámos essa noite em Sena que no dia seguinte íamos visitar a impronunciável vila de Muziwangungune (santinho!). Quando andávamos à procura de quarto para ficar, o Milton sugeriu um quarto simpático com duas camas, ar-condicionado, quarto de banho privativo, mas rapidamente mudou de ideias assim que ao mexer numa das almofadas um pequeno rato decidiu saltar para cima de uma almofada e começar a correr pelo quarto. O empregado da pensão nem mexeu, como se aquilo fosse uma situação casual, e pouco tempo depois pergunta “ficam com este?”. Estranhamente, recusámos a pensão.

No dia seguinte rumámos para Nhamppazza com a Mahindra a fazer um barulho estranho no amortecedor do lado esquerdo e com as rodas traseiras a aquecer. As rodas aqueciam de tal forma que era possível ver a água que mandávamos a ferver e a esfumaçar (garanto que conseguia estrelar ali um ovo!). Chegando a Nhamappazza, deparei-me com uma cidade que não possuía electricidade. O quarto era iluminado com o auxílio de uma lanterna para campismo, tivemos de jantar à luz de uma vela (qualquer comentário homofóbico será banido, a pessoa em causa será perseguida e atacada) e fomos para uma festa local que tinham música e uma arca frigorífica alimentas com o auxílio de um gerador.

Ser o único branco numa festa moçambicana é como que uma bomba de oxigénio para a nossa auto-estima. Fui considerado quase como uma celebridade local! Os miúdos vinham ter comigo para brincar e ofereciam-me carne de ratazana (sim, eles caçam, vendem e comem carne de ratazana), conheci o Osvaldo que gostou tanto de mim que me oferecia de tudo até as raparigas locais e ainda deu para dar uns passos de uma dança que não consigo voltar a repetir. Este Osvaldo era, de facto, uma pessoa muito carente pois para além de gostar demasiado de tocar, perseguia as mulheres locais com uma nota de 50 meticais ao que elas respondiam “não tenhas dinheiro que chegue para mim!”. O preço era de 100 meticais, pouco mais de 2,50 euros…

No dia seguinte decidimos passar num mecânico para ver o que se passava com as rodas traseiras. A caminho do mecânico descobri as potencialidades de se ter uma Mahindra em Moçambique. Ia sossegadinho na estrada a estranhar o facto de ainda nenhuma brigada da polícia de trânsito nos ter mandado parar, quando subitamente vejo um militar, que estava sentado numa cadeira à beira da estrada, a levantar-se e saudar-nos com uma continência. Claro, que uma pessoa como eu está habituada a todo este tipo de regalias, mas mesmo assim decidi arriscar na pergunta: “Oh Milton, porque é aquele senhor militar tão simpático nos saudou de forma tão cortês e oficial?” (é possível que a pergunta tenha sido mais do género: “Oh meu cabr** porque é que aquele merd** daquele feijão-verde se levantou quando nós passámos?”), ao que ele me explicou que aquele tipo de carrinhas é muito utilizada pelos chefes de polícia e pelo estado Moçambicano. Lindo, pensei eu, isto é que vai ser sempre assapar e roubar bancos com o aval do Estado!

Lá remediamos o problema do mecânico e fomos deixar o Eng. Jemusse para seguirmos para Quelimane onde nos íamos encontrar com o Eng. Semente. Chegámos a Quelimane no dia da paz moçambicana (neste dia celebra-se a assinatura do acordo de paz que findou a guerra entre a Frelimo e a Renamo, que dividiu e arrastou o país para uma guerra de mais de 16 anos) e de imediato encontramos o Sr. Dhakama (líder da Renamo) que tinha anunciado que a paz ia acabar e que a guerra iria voltar (mas ao que parece já ninguém o leva a sério). No dia a seguir fomos visitar a vila de Milevane e, a caminho, parámos num acampamento de padres que gentilmente nos ofereceram o pequeno-almoço e indicaram-nos qual o melhor caminho.

A vila de Milevane situa-se a mais de 1000 metros de altitude (sim, em Moçambique há montanhas que fazem a Serra da Estrela ficar corada), é um complexo de freiras totalmente autónomo e onde albergam e ensinam cerca de 250 crianças. Havia lá de tudo, desde leite, queijo e manteiga feitos através das cabras Sul-Africanas/Moçambicanas que por lá existiam, tinham porcos, galinhas, produziam óleo de girassol, tinham água limpa e potável (coisa rara por cá) que descia da montanha, fruta do mais invulgar que já vi, etc… A irmã Rocio, espanhola a viver em Moçambique há 5 anos, mas que já tinha vivido em Angola por 11, mostrou-se bastante amistosa e calorosa e demorou apenas 5 horas (!!!) a mostrar-nos tudo aquilo que a vila tinha para oferecer. Ao longe na montanha podiam-se ver vários fogos que, segundo a própria, os locais ateavam à procura por vezes de um simples rato que conseguissem apanhar e vender à beira da estrada. De positivo o almoço e o lanche 100% “caseiro” que nos foi oferecido. Fomos dormir a Mocuba que no dia seguinte tínhamos de viajar cedo até à última vila de todas, Mulela no Distrito de Pebane.

Acordámos, tomámos o pequeno-almoço e o Sr. Eng. Semente informa-me que afinal a vila que íamos visitar tinha sido alterada por outra (uma constante nestas minhas viagens com elementos do FUNAE). Ainda tentei argumentar que isso não era concebível e que o plano traçado era para ser cumprido, mas tal como o país, vivi ali uma democracia “ditaduresca” em que podes dizer o que quiseres que as decisões estão tomadas. O novo destino seria então a vila de Ndabuenda (Santinho outra vez! É melhor agasalharem-se que isso deve ser uma virose qualquer que para aí anda…)
Percorremos então os mais de 300 kms até à vila. Chegados lá deparei-me com a vila mais supersticiosa de todas. Desde logo a começar com a Rainha da vila, que tinha conseguido este posto após ter lutado com a irmã que se tinha transformado em hipopótamo (não se riam que os locais acreditam mesmo nisto!!), depois conheci um pastor de uma seita religiosa que só me deixava entrar em sua casa pela porta das traseiras, uma vez que não era digno de entrar pela porta principal e a população que dispunha as suas casas o mais perto possível da casa da Rainha na esperança que esta as protegesse.

Esta vila tinha realmente algo de mágico; a paisagem misturava-se entre o piso composto por uma espécie de barro muito solto que quando levantava formava uma névoa avermelhada no ar, conferindo-lhe uma cor única e calorosa com uma imponente montanha que se avistava ao longe como que a guardar a vila. As próprias crianças eram diferentes, por norma, as crianças sempre que vêm o carro a chegar aproximam-se e sorriem, mas quando saímos do carro elas fogem, fruto das muitas histórias que os aldeões contam acerca do homem branco mau, que remontam aos tempos do colonialismo. Estas crianças eram diferentes, aproximavam-se de nós, cumprimentavam-nos, falavam connosco, pediam-me para lhes tirar fotos e até houve uma que me teve a mostrar a guitarra que tinha feito e que curiosamente tocava! Com grande pena minha, tivemos de vir embora demasiado cedo, mas guardarei para sempre na memória aquela vila e a partida com os miúdos todos a correrem atrás da carrinha a acenar e a dizer “tttccchchhaaauuuu!”

A dormida nessa noite voltou a ser na bela cidade de Quelimane, a quarta maior do país onde quase não existem, táxis, tchopelas e chapas. O transporte é feito de bicicleta… por momentos pensei que estava na China ou na India tal era o número de ciclo-taxistas (não sei se isto existe, mas gostei do termo e agora fica!) que tornava o conduzir numa tarefa mais difícil que convencer o Passos Coelho a baixar os impostos…

A manhã seguinte foi a de pela terceira vez procurar um mecânico que nos tentasse resolver o raio da roda que não parava de aquecer e procurar um pneu e uma jante suplente para fazermos os mais de 1600 kms que tínhamos pela frente. Lá nos conseguimos desenrascar e seguimos a viagem de dois dias rumo a Maputo (nesta altura já só imaginava a minha caminha no meu belo T3).
A viagem de dois dias correu de forma mais ou menos normal, comprámos uma série de mercadorias que eram vendidas à beira da estrada, vi a quantidade de formas que o pessoal arranja para vender a carne de ratazana, de gazela, javali ou de galinha, enfrentámos todo o tipo de animais que decidem atravessar a estrada sem olhar para os dois lados da estradas, inclusive pessoas e ainda demos boleia a dois policias que nos mandaram parar para que os pudéssemos levar juntamente com um prisioneiro. Mandámo-los para a parte de trás da carrinha e quando perguntámos o que tinha feito o rapaz de mal, responderam “violou uma menor” (pois… eu sei…).

Dormimos em Massinga e no dia seguinte chegámos finalmente a Maputo por volta das 20h, mas sem antes nos banharmos na bela praia da Baía dos Cocos perto do Tofo (se querem ver um Moçambicano feliz, é darem-lhe um mar com onda). Para trás ficou muito pó, horas mal dormidas e mais uma aventura.

Por Maputo as coisas têm corrido dentro da “normalidade”… Fomos a um espectáculo de magia onde o protagonismo vai para o David que fez de assistente com uma performance capaz de fazer corar a Belle Dominique e onde a Marina demonstrou toda a sua arte e perícia ao partir o copo, na primeira vez que lhe pegou, que o David tinha ganho como prenda pela sua prestação.
Fomos à paradisíaca ilha de Bazaruto, onde para além de uma corrida a descer um duna que o Charles perdeu (é possível que não, mas eu é que estou a contar a história), viajámos num barquinho à vela com ondas capazes de virar o Titanic, mas com as quais não me preocupei muito já que o nosso comandante ia a descascar batatas com uma catana enquanto tentava manter o barco direito, no último fim-de-semana fomos ao Kruger Park fazer um safari onde vi uma série de bicharada e inclusive um leopardo a caçar que os mais cépticos continuam a não acreditar e fomos a Durban que é uma espécie de Miami africana e onde não me importava de ter uma casinha à beira-mar.

De resto continua tudo na mesma, as meninas que moram na Maguiuana arranjam todo e qualquer motivo para fazer festas lá em casa (acho que a próxima festa temática é a celebração dos 126 dias de libertação do povo de Mihugaefican), o João Vieira continua a fazer um Inov à parte da malta, em parte porque ninguém gosta dele, o André lá voltou da sua viagem de 2 meses também pelo mato, o Charles, bem… continua o Charles, o Venes, o Luciano, o Cardoso e o David continuam com uma relação demasiado próxima com a cerveja local (eu não, juro!!), as meninas do T4 (Romina e Sónia) continuam a fazer as vontadinhas todas ao David assim como a Patrícia e a Marina fazem tudo o que a besta do Luciano pede, o Luís e o Daniel continuam perdidos ela Matola e continuo à espera do convite para a churrascada, o Jaime voltou para Portugal de castigo por não ter lavado a loiça lá de casa e foi substituído pelo Ricardo e o Mário se não se põe a jeito leva porrada porque já é a segunda vez que chego a casa e não tenho uma recepção que envolva mulheres nuas e barris de cerveja.

Não garanto que continue a escrever muito mais (tenho já outro post em mente mas não sei ainda se publique se não), em parte porque recebi uma proposta para pôr tudo isto num livro intitulado “gajo que escreve estupidamente mal, mas que no entanto as pessoas continuam a ler e a fingir interesse” (é mentira, fui convidado sim, mas para ir para um circo dançar a Macarena apenas com uma tanga tigresa, enquanto um macaco me dá pauladas na cabeça, estou reticente… não gosto muito da cor da tanga). Os outros dois motivos que me levam a não continuar esta minha diarreia literária devem-se aquela patologia de que sofro e quem tem piorado com o passar dos tempos chamada de preguiça e também porque a partir de Outubro abandonarei Moçambique rumo a África do Sul para umas merecidas férias de 15 dias. Talvez depois faça um post sobre Cape Town. Ou então tiro só fotos para todos ficarem verdes de inveja! ;)

Infelizmente o meu tempo por cá está quase a terminar. Posso dizer que levo daqui muitas histórias, amigos para a vida e um país que certamente contarei visitar ou até habitar. De facto estar longe de tudo não é fácil, mas o facto de nos apoiarmos muito todos uns nos outros foi, e tem sido, uma enorme mais valia.
 Já sinto alguma nostalgia daquilo que cá vou deixar, mas a vida é assim mesmo e os momentos que ficam são para ser vividos, celebrados e para sempre recordados.

Ok, chega de mariquices, até porque ainda falta um mesito.

Até breve! Estamos juntos!!!

PS – Era mesmo para colocar fotos!! Eu tirei!! Não foram mais que duas mas tirei, só que não sei o que fiz à minha máquina fotográfica… Se a encontrar actualizo o post.